Presidente recebe gestores de topo. Que pedem um desejo para 2015: “Estabilidade política”
Estabilidade política. Se Portugal quiser convencer os investidores estrangeiros a injetar capital na economia portuguesa, é essa mensagem que tem de promover: que o país está “sólido na zona Euro” e que as políticas não mudam apenas porque mudam as caras do poder. Quem o diz é Miguel Fonseca, presidente da Toyota Financial Services para a Europa e África, na Alemanha, e Carlos Silva Lopes, diretor de Marketing da Dow Performance Plastics, na Suíça, dois dos conselheiros da Diáspora Portuguesa que esta segunda-feira se reúnem em Cascais, naquele que é o último encontro anual do Conselho antes das eleições legislativas de 2015.
“O fundamento do investidor é a confiança. Se não estivermos num país que oferece estabilidade enquanto membro da União Europeia, enquanto economia estável e que tem uma situação política estável, então não somos um país que merece a atenção dos investidores”, adiantou Miguel Fonseca ao Observador.
O presidente da Toyota Financial Services é um dos 68 conselheiros da associação sem fins lucrativos que nasceu em dezembro de 2012, com o patrocínio do Presidente da República, Aníbal Cavaco Silva, para estreitar as relações entre Portugal e a sua diáspora – portugueses e descendentes que exercem cargos de influência nas áreas económica, científica, cultural e de cidadania, em 20 países.
“Penso que nesta altura, o país encontrou uma plataforma na qual pode crescer“, afirmou Miguel Fonseca, referindo-se às reformas “necessárias” levadas a cabo pelo Governo, como a reestruturação das despesas do Estado, a disciplina nas contas públicas ou a revisão da lei laboral. “Embora essas reformas tenham provocado uma redução do Produto Interno Bruto (PIB) num determinado período, eram necessárias para que a economia começasse a recuperar”, defendeu.
Para Carlos Silva Lopes, a despesa pública continua a ser um dos calcanhares de Aquiles da economia. “As despesas do Estado ainda consomem muitos dos recursos financeiros, o que não permite baixar a carga fiscal para as empresas e para os cidadãos”, revelou o conselheiro. Quais são os pontos fortes da economia portuguesa? A qualificação e flexibilidade do capital humano, as infraestruturas “modernas”, e um ambiente que Carlos Silva Lopes classifica como muito favorável ao desenvolvimento de negócios globais.
“Há que destacar a situação estratégica enquanto porta de entrada (e de saída) da Europa, sobretudo em relação ao tráfego marítimo, onde temos uma posição estratégica assinalável”, adiantou. Para o conselheiro, é a combinação destes fatores que faz de Portugal um sítio “muito interessante”.
Miguel Fonseca chama a atenção para a concorrência que Portugal tem no contexto global, referindo-se aos países da Europa de Leste, sudeste asiático, da América Latina e do Norte de África. “Hoje, a economia é global, já não se pode falar sequer de uma economia a nível europeu. Aqui há uns anos, Portugal cresceu porque estava num espaço europeu, onde não concorria com a Europa de Leste, por exemplo“, refere. Para ganhar vantagem, o país deve diferenciar-se da concorrência, adotando uma estratégia de longo prazo, e proporcionar um ambiente de confiança aos investidores, ou sejam, mantendo-se estável.
“O nosso país tem capacidades a nível da criatividade e da iniciativa. Temos uma juventude muito dinâmica nesse sentido e uma sociedade curiosamente muito aberta a soluções novas. Somos um país muito inovador, porque tem capacidades específicas”, referiu. Por isso, Portugal deve apostar estrategicamente no desenvolvimento dessas capacidades, “a grande escala”, com enfoque nas universidades e no desenvolvimento de currículos universitários.
“Penso que Portugal deveria olhar para o futuro e para as mudanças que há a nível social e global e procurar uma posição nessas novas áreas de inovação, onde a concorrência dos países em vias de desenvolvimento seja muito menos significativa. Nessas áreas, podemos ser muito mais competitivos”, disse Miguel Fonseca.
Desconhecimento e desconfiança Carlos Silva Lopes explica que, na Suíça, os investidores olham para Portugal com desconhecimento e desconfiança, mas com curiosidade para investir. Desconhecimento no que diz respeito às reformas e desconfiança sobre como vão ser implementadas. A justiça “lenta e não eficaz” e a burocraciasão outras das características que o conselheiro recorda das conversas que teve com investidores.
“Nós queremos investidores de longo prazo, que vêm para estar durante muito tempo e esses precisam de ter uma segurança que as políticas fiscais e laborais ficam, e não mudam com a cor do Governo”, revela, acrescentando que a estabilidade política e social “são primordiais”.
O conselheiro adianta que, para Portugal conseguir promover melhor a sua imagem no estrangeiro, é preciso que sejam criadas políticas de promoção concertadas através de várias instituições, estáveis com horizonte temporal de cinco, ou dez anos.
Quais são os grandes problemas de quem quer investir em Portugal? Uma política fiscal que ainda é onerosa para as empresas, revela Carlos Silva Lopes. “É fácil começar ou abrir um negócio, mas o sistema fiscal para as Pequenas e Médias Empresas (PME) ainda é complexo e burocrático. Este sistema tem de ser agilizado”, referiu, acrescentando que o programa para reduzir de uma maneira sustentável a carga fiscal para as empresas deve ser “consequente e estável”.
Quanto a uma eventual saída da crise, Carlos Silva Lopes adianta que a sensação que tem é de que “se bateu no fundo e se iniciou a recuperação”. “Uma recuperação sustentada, talvez mais lenta do que a maioria dos portugueses deseja, mas uma recuperação que permite implementar as reformas e evitar a repetição dos erros do passado”, adiantou. Miguel Fonseca concorda: o pior já ficou para trás, mas o fim não vai ser abrupto.
“Acho que a crise chegou de repente, mas não se vai embora com a mesma velocidade. Se mantivermos os fatores de estabilidade política, económica e social que referi anteriormente, acredito que a recuperação vai ser lenta, mas clara”, adiantou Miguel Fonseca.
O encontro de hoje será encerrado com uma intervenção pública de Cavaco Silva, depois de uma reunião que durará toda a manhã à porta fechada. O Conselho da Diáspora é integrado por personalidades tão variadas como Horta Osório, do Lloyds Bank, António Esteves, da Goldman Sachs, António Damásio, investigador científico na Universidade da Califórnia, Durão Barroso, João Fernandes (atualmente no Museu Rainha Sofia), Nuno Mota Pinto (Banco Mundial), Carlos Tavares (Peugeot Citroen) ou Filipe de Botton (Logoplaste), que abrirá a reunião.
Por Observador, Ana Pimentel, 22 Dezembro 2014