7 de Novembro de 2024

Entrevista com Tiago Almeida: “Empresários devem apostar fortemente na inovação”

Portugueses que se destacam lá fora ajudam a descobrir onde estão oportunidades de negócios e que tipo de empresas e atividades o país pode atrair. Uma iniciativa que junta o Negócios e o Conselho da Diáspora Portuguesa.

1- O que o levou a sair de Portugal?

Desde a minha juventude, tive vontade de explorar outras geografias que pudessem expandir as minhas oportunidades de crescimento profissioal e pessoal. Em 2009, tomei a decisão de sair de Portugal para fazer um MBA no INSEAD, uma das melhores escolas de negócios do mundo, com campus em Paris e Singapura. Este foi um passo decisivo na minha carreira, pois frequentar um dos MBA’s mais internacionais do mundo não só me preparou para enfrentar desafios globais, como também abriu portas para a minha transferência para a sede da empresa na Holanda, dando início à minha jornada de explorar novas geografias e mercados.

Depois da Holanda, tive a oportunidade de viver em São Paulo e no Rio de Janeiro, trabalhando na Tishman Speyer, um dos maiores gestores globais de fundos imobiliários, em cidades que me ofereceram uma perspetiva única sobre o setor imobiliário. Posteriormente, mudei-me para o Médio Oriente, onde vivi em Dubai e Abu Dhabi, atuando em consultoria estratégica na Strategy& (parte do network PWC) e em investimentos imobiliários no Abu Dhabi Capital Group. Atualmente, estou estabelecido em Riade, onde lidero a área de investimento imobiliário da região para a Hassana, gestora de um dos maiores fundos de pensões do mundo.

A minha experiência em diferentes mercados globais permitiu-me desenvolver uma visão abrangente e estratégica sobre os ciclos económicos, o que é essencial para garantir o sucesso e a resiliência no setor imobiliário.

2- Que vantagens ou desvantagens lhe trouxe o facto de ser Portugueses?

Ser português revelou-se como uma vantagem determinante durante o meu período no Brasil, entre 2011 e 2017. A partilha da língua e a profunda ligação histórica entre os dois países facilitaram a minha integração, tanto a nível pessoal como profissional. No Brasil, não só conheci a minha esposa, como também criei uma rede de amizades e relações profissionais que perduram até hoje.

Além disso, ser português ajudou-me a desenvolver uma versatilidade cultural que me tem sido muito útil em contextos tão diferentes como o Médio Oriente. A nossa herança de abertura ao mundo e capacidade de adaptação revelou-se uma força, permitindo-me integrar e aprender rapidamente em ambientes multiculturais.

3- Que obstáculos teve de superar e como o fez?

Ao longo da minha carreira internacional, enfrentei diversos obstáculos, sendo os mais comuns as barreiras linguísticas e as diferenças culturais. Cada nova mudança trouxe consigo o desafio de aprender e adaptar-me a uma nova realidade. Na Arábia Saudita, por exemplo, embora uma parte significativa da população fale inglês, o árabe é a língua predominante em muitas situações, o que criou alguns desafios iniciais nas interações diárias e em reuniões formais.

A tecnologia tem sido uma ferramenta importante para superar as barreiras linguísticas, mas foi a minha determinação em aprender e respeitar as culturas locais que realmente fez a diferença. Cada nova experiência cultural representou uma oportunidade para crescer, tanto a nível pessoal quanto profissional. Acredito firmemente que essa adaptabilidade e abertura a diferentes formas de trabalhar e pensar foram essenciais em ambientes tão diversos ao longo da minha carreira.

4- O que mais admira no pais em que está?

O que mais me impressiona na Arábia Saudita é a energia e o otimismo que se sente, sobretudo entre os jovens sauditas, que têm sido fundamentais na transformação do país. A Visão 2030, lançada em 2016, é um plano ambicioso que está a moldar o futuro da Arábia Saudita, promovendo a diversificação económica, a modernização das infraestruturas e a abertura ao turismo e ao entretenimento.

O que admiro particularmente é a determinação com que o país está a implementar estas mudanças, com uma velocidade e eficácia impressionantes. A capacidade do governo e das empresas em executar grandes projetos de forma rápida e eficiente é algo inspirador. Esta transformação está a redefinir a imagem da Arábia Saudita no cenário global, e eu sinto-me privilegiado por poder testemunhar e participar neste momento histórico.

5- O que mais admira na empresa/organização em que está?

Trabalhar na Hassana, gestora de um dos maiores fundos de pensões do mundo, tem sido uma experiência enriquecedora. Admiro o rigor com que a empresa gere os seus investimentos, alinhando-se com os padrões globais dos melhores fundos de pensões. O compromisso com a criação de valor, aliado a uma governança sólida, é uma das razões pelas quais a Hassana se destaca no panorama global.

Além disso, tenho o privilégio de trabalhar com profissionais extremamente talentosos e dedicados, cuja missão é garantir a sustentabilidade do fundo e um futuro financeiro seguro para as próximas gerações sauditas.

6- Que recomendações daria a Portugal e aos seus empresários e gestores?

Portugal tem um enorme potencial para se destacar ainda mais no cenário global. A minha recomendação para empresários e gestores é apostar fortemente na inovação e na internacionalização, elementos cruciais para garantir competitividade e crescimento sustentado. Os gestores portugueses são conhecidos por possuir a capacidade de simplificar questões complexas, o que os torna particularmente valiosos no mercado global.

Devemos também capitalizar a nossa localização geográfica estratégica e o clima atrativo, não só para captar investimento estrangeiro, mas também para atrair talento internacional disposto a estabelecer negócios ou centros de excelência em Portugal. A segurança e a estabilidade social do país são ativos de grande valor para investidores que procuram ambientes de baixo risco.

A diversificação de mercados, como temos observado com sucesso no setor do turismo, poderia ser estendida a outras áreas da economia, fomentando um crescimento mais equilibrado e resiliente.

7- Em que setores do país onde vive poderão as empresas portuguesas encontrar clientes?

A Arábia Saudita está a passar por um período de grande crescimento e transformação, especialmente nos setores de construção, infraestrutura, turismo e energias renováveis. Com a Visão 2030, o país está a diversificar a sua economia e a abrir-se ao investimento estrangeiro, criando oportunidades significativas para empresas internacionais que possuam expertise nessas áreas.

Além disso, eventos globais de grande escala, como a Expo 2030, em Riade, e o Campeonato do Mundo de 2034, trarão oportunidades adicionais em várias áreas, incluindo construção, tecnologia, hospitalidade e gestão de grandes eventos. Estes eventos irão exigir uma expansão significativa de infraestruturas e serviços, onde as empresas portuguesas poderão oferecer soluções inovadoras e de alta qualidade, contribuindo para o sucesso desses projetos ambiciosos.

8- Em que setores de Portugal poderiam as empresas do país onde está querer investir?

Com a minha experiência no setor imobiliário, posso afirmar que Portugal continua a ser um destino muito atrativo, especialmente para investidores estrangeiros que procuram diversificação. O setor residencial de luxo e do turismo tem sido um dos principais focos, com forte procura em áreas como Lisboa, Porto e Algarve, onde a procura internacional continua a crescer.

Além disso, empresas sauditas, alinhadas com a Visão 2030, podem encontrar em Portugal oportunidades estratégicas que apoiam a diversificação da economia saudita, especialmente nos setores de tecnologia, segurança alimentar e energias renováveis.

9- Qual a vantagem competitiva do país em que está que poderia ser replicada em Portugal?

A Arábia Saudita destaca-se pela sua visão estratégica de longo prazo, algo que pode ser uma lição importante para outros países. A Visão 2030 é um exemplo notável de como um país pode alinhar objetivos ambiciosos com uma execução eficaz, resultando em grandes investimentos em infraestruturas, tecnologia, energia e turismo.

Em Portugal, essa abordagem poderia ser replicada no que diz respeito à modernização de infraestruturas críticas, como o novo aeroporto de Lisboa e o TGV, temas discutidos há décadas, mas sem avanços significativos. O que falta é uma visão política de longo prazo, com acordos transversais que transcendam ciclos eleitorais e garantam a concretização dessas obras essenciais para o crescimento económico e a competitividade do país no cenário global.

10- Pensa voltar para Portugal? Porquê?

Portugal está sempre no meu coração e, sem dúvida, penso em voltar. Há algo único na qualidade de vida que o nosso país oferece e, claro, a proximidade da família é um fator que pesa. No entanto, o regresso será uma decisão tomada no momento certo, tanto a nível pessoal como profissional. Não tenho planos concretos para voltar a curto prazo, mas acredito que, no futuro, quando as condições forem ideais, será um retorno natural a um país que adoro e ao qual estou profundamente ligado.