Portugueses que se destacam lá fora ajudam a descobrir onde estão oportunidades de negócios e que tipo de empresas e atividades o país pode atrair. Uma iniciativa que junta o Negócios e o Conselho da Diáspora Portuguesa.
1- Como, por que razão e quando os seus antepassados deixaram Portugal e colonizaram os Açores e mais tarde emigraram os Estados Unidos?
Passei vários anos explorando essa questão, através de registros ancestrais e de DNA. A minha linha paterna foram os primeiros colonizadores dos Açores, desembarcando na Ilha de Santa Maria em meados de 1400 e, anteriormente, na Ilha da Madeira. Vieram, para a glória de Portugal, como Cavaleiros de Cristo e descendentes de Dom Afonso Henriques. A rápida expansão da população numa pequena ilha (16 km de ponta a ponta) fez com que muitos emigrassem para ilhas maiores dos Açores, do Brasil ou dos Estados Unidos. A minha linha materna, da Ilha do Pico, residia ali desde 1600 e descendia dos colonizadores flamengos e portugueses do século XV. Esses avós não foram os únicos a deixar as ilhas e ir para a América, na passagem para o século 20, seguindo a trilha da caça às baleias até Massachusetts e, mais tarde, para a Califórnia. A América ofereceu oportunidades, com trabalho árduo e poupança, e os meus avós, e mais tarde os meus pais, mantiveram esse objetivo na agricultura e noutros trabalhos manuais. A comunidade luso-americana que conheço desde meados do século XX atéagora não estava focada no regresso a Portugal, para além de visitas e festas. Poucas coisas nos diferenciavam da Anglo-América. Foi apenas no ano 2000 que “descobri” a identidade portuguesa através de colegas científicos. Carlos Garcia, da Universidade de Lisboa, convidou-me para visitar Lisboa, Coimbra e Porto. Lá conheci Arsélio Pato de Carvalho, da Universidade de Coimbra, e ele colocou em perspectiva os principais fios da diáspora portuguesa, já que tinha passado a sua juventude na Califórnia. Ele notou o baixo nível de escolaridade dos luso-americanos, que mais tarde confirmei através dos dados do censo dos EUA como o mais baixo entre os imigrantes do Velho Mundo (as excepções são os Amish e os Romani, que desencorajam a educação). Em segundo lugar, Arsélio sugeriu que o baixo nível de escolaridade e o foco na poupança eram provavelmente o resultado do desejo de acumular riqueza para regressar a Portugal.
Antes de Carlos e de Arsélio, pensava nas minhas origens, de camponeses de um país igualmente pobre. Explorar a história e a academia portuguesas através das lentes do meu fio genético inspirou a identidade portuguesa e o regresso a Portugal em espírito. Em inúmeras ocasiões atuei como revisor de programas da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa, da Universidade de Coimbra e da Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT). Fui presidente da Organização Nacional dos luso-americanos e sou ativo na Portuguese American Post-Graduate Society (PAPS) e na Portuguese American Leadership Council of the United States (PALCUS), com foco no aumento da identidade portuguesa e na construção de pontes com outros membros da diáspora ibérica. Ao longo de um quarto de século a trabalhar em estreita colaboração com Portugal, testemunhei um milagre de rápido ressurgimento intelectual que duvido que seja visto noutros lugares.
2- O que aprendeu ao encontrar a sua identidade portuguesa?
Atribuí muitas das minhas características familiares à minha juventude numa fazenda numa parte isolada da costa central da Califórnia. Entre elas estavam trabalho árduo, finanças frugais e fortes valores familiares. Mais tarde, aprendi, através do casamento com uma mulher da Cidade do México, que estes valores eram partilhados por outros ibéricos. Com ligações a Portugal, aprendi que a relativa falta de educação formal era comum entre os luso-americanos e, num inquérito à minha família, descobri que a maioria estava desencorajada da educação avançada em favor do emprego precoce. Em contraste, o meu pai incentivou a educação e a exploração do mundo natural. O estudo da biologia marinha está diretamente ligado à estreita ligação da minha família com o mar. A adaptabilidade portuguesa foi fundamental para a aplicação da biologia marinha às ciências do cérebro e às doenças.
3- Qual é o seu contributo para Portugal e para os luso-americanos?
Com o orgulho da identidade portuguesa veio a obrigação de contribuir para o nosso povo na América e em Portugal. Ajudei a fundar a Organização Nacional dos Luso-Americanos (NOPA), para criar maior consciência e orgulho de identidade. Organizamos eventos educativos para jovens portugueses e informamos a comunidade sobre acontecimentos políticos.
Fui um orador frequente e apoiante da Sociedade Luso-Americana de Pós-Graduação (PAPS), onde destaquei a origem partilhada e contrastante dos luso-americanos e dos portugueses.
Sua Excelência Domingos Vital, Embaixador de Portugal nos EUA, nomeou-me seu cônsul.
Portugal utiliza frequentemente a minha experiência científica em Neurociências-Doença de Alzheimer para rever programas de centros para a FCT, bem como projetos individuais. Ao longo de uma década, tive a grande honra de aconselhar e rever os Prémios Santa Casa da Misericórdia de Lisboa em Neurociências. Através destas avaliações, acompanhei Portugal no desenvolvimento de programas de classe mundial. No entanto, há muito a fazer para criar a confiança necessária para empreender investigação de ponta – a base já existe, mas os próximos passos são críticos. Tenho uma forte ligação à Universidade de Coimbra, como orientador, mentor, colaborador e amigo. Estes esforços foram reconhecidos pela minha eleição para a Academia das Ciências de Lisboa.
4- Que recomendações daria a Portugal e aos seus empresários e gestores?
Em primeiro lugar, os EUA têm muito a aprender com Portugal, que recuperou e modernizou uma economia em tempo recorde. No entanto, Portugal não deve ser demasiado pretensioso relativamente ao seu progresso. Embora Portugal tenha iniciado numerosos empreendimentos em sectores de alta tecnologia, como por exemplo a energia, é insuficiente para lançar toda a cidadania num país que historicamente é muitas vezes avesso ao risco e com níveis de competências díspares. Vejo que isto está a mudar, mas é fundamental que haja um impulso para colocar Portugal como o principal concorrente em sectores específicos, e depois consciencializar o mundo. A inclusão da população portuguesa em empreendimentos que promovam o futuro, ao mesmo tempo que se apoiam na indústria tradicional, é também fundamental para promover o bem-estar social. Um maior sucesso requer adicionalmente políticas informadas e alinhadas nos domínios da educação, formação, governo, indústria e capital.
5- Em que sectores do país onde reside as empresas portuguesas podem encontrar clientes?
Os Estados Unidos impulsionaram e alimentaram o mundo moderno. A inovação nos estados da Califórnia, Texas e Washington criou o mundo moderno. Estes centros são mercados para as indústrias biotecnológicas e cibernéticas de Portugal. Com a pressão para diversificar os fornecedores dos aliados dos EUA, com mão-de-obra qualificada e económica, Portugal está bem-posicionado para satisfazer as necessidades dos EUA em eletrónica e biotecnologia. Os centros em Lisboa servem atualmente os líderes da indústria farmacêutica europeia na biofabricação de GMP, mas são menos conhecidos nos EUA. A Biocant, no concelho de Coimbra, é um modelo de parceria universidade-privada raramente visto nas universidades dos EUA, mas, mais uma vez, pouco conhecido nos EUA. Com apenas uma grande empresa farmacêutica, a Bial, as oportunidades de desenvolvimento de medicamentos são limitadas em Portugal. A experiência e o capital nos EUA acelerarão o desenvolvimento de Portugal como fornecedor, inovador e produtor de produtos finais.
Uma forte tradição agrícola é comum tanto nos EUA como em Portugal. Uma maior valorização da maior qualidade da comida portuguesa: o azeite e o vinho são lentamente apreciados, mas pode ser feito mais marketing que desenvolva uma identidade de marca. Este ano, o maior mercado de mercearia premium do Texas, o Central Market, realizou o “Passaporte para Portugal”, que apresentava autêntica comida portuguesa. O evento levou a lojas lotadas e a uma maior valorização da gastronomia portuguesa como única, sofisticada, impactando, por extensão, o que Portugal tem para oferecer noutros setores.
Finalmente, os numerosos luso-americanos nos EUA devem ser mobilizados como embaixadores de oportunidades mútuas, quer sejam em tecnologia ou em marketing.
6- Qual é a vantagem competitiva do país onde se encontra que poderia ser replicada em Portugal?
Destacam-se a tecnologia, a biotecnologia e o mundo cibernético. Acompanho a biotecnologia e a cibertecnologia em Portugal há um quarto de século, e o seu progresso e estatuto são de classe mundial. As universidades portuguesas têm importantes parcerias educativas com a Universidade do Texas em Austin, o Massachusetts Institute of Technology, a Carnegie Mellon University e a Harvard Medical School, trazendo confiança ao talento residente. A tecnologia nos EUA nasceu diretamente das universidades (por exemplo, Silicon Valley-Stanford University), e Portugal tem um modelo semelhante na Biocant-Universidade de Coimbra. Portugal deve continuar a procurar as melhores práticas para desenvolver o seu próprio modelo. É essencial que a política governamental e industrial retenha trabalhadores qualificados e criativos, para que estes alimentem o desenvolvimento interno em vez de partirem, como tantas vezes aconteceu no passado.
Consulte a entrevista original aqui.