Portugueses que se destacam lá fora ajudam a descobrir onde estão as oportunidades de negócios e que tipo de empresas e atividades o país pode atrair. Uma iniciativa que junta o Negócios e o Conselho da Diáspora Portuguesa.
1- O QUE O/A LEVOU A SAIR DE PORTUGAL?
Ao longo da minha carreira profissional, cedo tive desafios no exterior. Encaro o estímulo da carreira internacional com otimismo e vontade, creio que com um pouco do espírito dos navegadores portugueses. A experiência da Roménia começou há 15 anos: fui indicado para abrir uma grande unidade industrial do grupo com quem colaboro nesta geografia. Em 2009, a Roménia era um país com forte atraso em relação a Portugal, com salários muito mais baixos e uma economia débil. As primeiras impressões da Roménia foram de um país atrasado no tempo, com uma administração burocrática e antiquada e uma economia pobre. Hoje é ao contrário, 15 anos depois: o país modernizou-se a um ritmo elevado, o investimento externo foi massivo e os fundos estruturais da EU determinantes. Reconheço na Roménia uma economia pujante, com crescimento económico nos principais indicadores e um elevado nível de investimento na área da construção. Nos anos mais recentes, os salários estão a ficar mais elevados do que em Portugal.
2- QUE VANTAGENS E DESVANTAGENS LHE TROUXE O FACTO DE SER PORTUGUÊS/A?
O cidadão português é bem aceite e acolhido na Roménia. Temos muitas parecenças nas tradições familiares, uma mesma matriz ética e cultural, o mesmo latim na língua. Isso é um ponto importante, pois a cultura e os valores compartilhados por um grupo de pessoas podem influenciar significativamente a maneira como nos relacionamos, tomamos decisões e nos comportamos. Resumiria, dizendo que nos sentimos em casa.
3- QUE OBSTÁCULOS TEVE QUE SUPERAR E COMO O FEZ?
Há sempre que transpor dificuldades de integração num novo país – há uma nova vida social. A adaptação a um novo país é uma prova que nem todos superam. Já vi muitos colegas a voltar para casa rapidamente. Aprender depressa o idioma Romeno, foi importante. Também, cedo procurei explorar as oportunidades da cultura local, muito intensa e rica em eventos. Fiz uma assinatura na melhor sala de concertos de Bucareste, o Ateneu Romeno, onde 5 dias por semana tem concertos e recitais de elevadíssima qualidade. Saía da fábrica e ia ouvir Mozart, Bartok ou Enescu. Aí, começam-se a conhecer novas pessoas, públicos diferentes, novos círculos de amigos. Bucareste é muito rica em eventos culturais, festivais de música… (foi assim que conheci a minha mulher). Procurei fugir dos “círculos de expatriados”, algo que considero essencial. Juntei-me com grupos sociais e clubes romenos, com interesses comuns. E temos de ser pacientes, leva tempo. Não existe integração instantânea. Temos de dar espaço e tempo para um ajustamento gradual, manter uma mente aberta e aprender.
4- O QUE MAIS ADMIRA NO PAÍS EM QUE ESTÁ?
A Roménia é um País com um enorme potencial. Tal como em Portugal, por aqui andaram e deixaram um forte legado, obra e conhecimento, os Romanos. Tem uma história muito rica, paisagens deslumbrantes e uma cultura diversificada. A região da Transilvânia é famosa por sua conexão com o mito do Conde Drácula, personagem de Hollywood inspirado no Conde Vlad Ţepeş, um sagaz defensor do território e sua independência. Integra ainda a Moldova, uma região rica em cultura, vinhos e saberes. A região sul, limitada pelo Danúbio, alberga a capital e é uma imensa planície agrícola. O país tem um património rico, castelos medievais, monumentos, vestígios romanos. Belezas Naturais, montanhas, vales, lagos… algumas paisagens romenas são de tirar o fôlego. O Delta do Danúbio é um dos maiores deltas fluviais da Europa – um paraíso para observação de aves, fauna e ecoturismo. A tradição folclórica é rica, com danças, músicas e festivais vibrantes. A Páscoa e outras tradições Ortodoxas são celebradas com fervor, também com similitudes aos ritos dos portugueses. A gastronomia caracteriza-se pelo porco, enchidos e fumeiro, algo que muito se assemelha às tradições gastronómicas lusitanas.
O setor industrial e tecnológico está em acelerado crescimento – são exemplos a informática, aeronáutica, e as comunicações. A Roménia está a tornar-se num pólo europeu para empresas de tecnologia, start-ups e unicórnios. Para além de Bucareste, cidades como Cluj-Napoca, Timişoara ou Constanta, estão a florescer, com inovação e talento com Universidades modernas e fortes a apoiar. O investimento está em ascensão.
O turismo não é de massas. Está em crescendo, com visitantes atraídos pelas belezas naturais, monumentalidade, cidades históricas e por preços que, por agora, ainda são acessíveis. A Roménia é um país que combina tradição com modernidade.
5- O QUE MAIS ADMIRA NA EMPRESA/ORGANIZAÇÃO EM QUE ESTÁ?
Tenho o privilégio de trabalhar com um grupo de investidores portugueses que vieram investir na Roménia, com uma perspetiva de longo prazo, e uma visão de endogeneizar o negócio. O grupo veio para a Roménia há 15 anos, com indústria, e ainda hoje integra várias dezenas de trabalhadores. Os investidores desenvolveram oportunidades em várias áreas de negócio, como a imobiliária, indústria alimentar, agricultura, ou energias renováveis. A Roménia é uma geografia com um volume de investimento relevante. No início da década de 2000, fez sentido desenvolver negócios em áreas que a Roménia ainda não dinamizava. Hoje, com uma visão de negócios e tecnologia mais avançada do que aquilo que fazemos em Portugal, conseguimos adaptar-se às circunstâncias quando a oportunidade impele a mudança.
6-QUE RECOMENDAÇÕES DARIA A PORTUGAL E AOS SEUS EMPRESÁRIOS E GESTORES?
A Roménia é uma economia em aceleração. De facto, é um país com um grande potencial de crescimento económico consistente. Recomendo. Nos últimos anos, a sua economia tem apresentado um desempenho sólido, impulsionando o aumento do estilo de vida dos cidadãos romenos, a “olhos vistos”, em rápida convergência com os padrões dos países evoluídos do mundo e da União Europeia em particular. No entanto, persistem alguns desafios. O país precisa de encontrar formas de equilibrar as suas finanças públicas, tendo demonstrado um défice algo crónico nas contas públicas, fruto de muitas pressões sociais, ainda que mantenha um endividamento público pequeno quando comparado com outros Estados. Os fundos estruturais da UE são, nos últimos anos, um fator forte de crescimento e modernização do país. Apesar destes desafios, a Roménia continua a ser uma economia em crescimento, com potencial para se destacar ainda mais no contexto europeu. A governação tem sido algo instável, mas apesar disso a economia floresce.
7- EM QUE SETORES DO PAÍS ONDE VIVE PODERÃO AS EMPRESAS PORTUGUESAS ENCONTRAR CLIENTES?
A Roménia tem uma economia diversificada, com contribuições significativas de vários setores. É conhecida a força da sua agricultura, um verdadeiro celeiro da Europa. Mas se explorarmos os setores com algum detalhe, vemos que o setor de serviços já desempenha um papel crucial na economia romena, contribuindo com quase 60% do PIB em 2021, o que inclui áreas como turismo, finanças, tecnologia de informação e serviços profissionais. A indústria representa aproximadamente 30% do PIB.
8. EM QUE SETORES DE PORTUGAL PODERIAM AS EMPRESAS DO PAÍS ONDE ESTÁ QUERER INVESTIR?
Os principais setores industriais incluem máquinas e elétricas e equipamentos, indústria automóvel, têxteis e calçado, metalurgia, produtos químicos, indústria alimentar, indústrias de petróleo, mineração e materiais de construção. Mas é na Agricultura que a Roménia se destaca, contribuindo com cerca de 5% do PIB. Os grãos, cereais e as oleaginosas, é a fatia mais forte; mas também frutas e hortícolas e a produção de carne são importantes para a economia agrícola. Naturalmente, na proximidade encontramos os seus principais parceiros comerciais que incluem Alemanha, Itália, França, Áustria e Polónia.
9- QUAL A VANTAGEM COMPETITIVA DO PAÍS EM QUE ESTÁ QUE PODERIA SER REPLICADA EM PORTUGAL?
O nível de educação da Roménia, como nos países de leste em geral, é elevado. Tem uma população ainda jovem, um forte domínio nas tecnologias e, recentemente, em particular, nas tecnologias de informação e programação.
O quadro fiscal é competitivo. Quer nos rendimentos das pessoas, quer das empresas, a Roménia apresenta uma competitividade fiscal muito favorável. Ainda que as pressões internacionais vão impondo alguma convergência, os sucessivos governos têm mantido a competitividade fiscal do território, favorecendo por um lado a eficácia da cobrança da receita, por outro, lado a atração do investimento externo. No salário médio, ainda há um potencial, mas está em convergência rápida com as economias europeias: hoje o salário médio bruto ronda os 1.700 euros e o líquido ronda os 1.000 euros. Mas nas principais cidades estas médias podem ser melhoradas significativamente.
10- PENSA VOLTAR PARA PORTUGAL? PORQUÊ?
Vou viver sempre nas duas geografias, seguramente. Estou em Bucareste a residir e visito Portugal todos os meses, por motivos profissionais e familiares. Hoje a mobilidade é fácil. Talvez seja mais fácil no futuro chegar de uma reunião em Aveiro ao meu apartamento de Bucareste, do que ir ao Algarve. Sou cidadão europeu.
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