Portugueses que se destacam lá fora ajudam a descobrir onde estão oportunidades de negócios e que tipo de empresas e atividades o país pode atrair. Uma iniciativa que junta o Negócios e o Conselho da Diáspora Portuguesa.
1- O que o levou a sair de Portugal?
Sempre tive curiosidade de conhecer outras culturas, pessoas e mercados. Creio que está no nosso ADN como Portugueses, esse genoma que nos faz sair e explorar novos mundos. Quando terminei o curso de gestão na Católica, em Lisboa, ingressei na Kearney, uma consultora global de negócios que me permitiu, desde muito cedo, fazer projetos fora, principalmente em Espanha. Depois do meu MBA nos EUA, em Filadélfia, na Wharton, com passagem por França, no Insead, um estágio em Londres e um regresso temporário a Portugal, a vontade de crescer profissionalmente e alargar horizontes fez com que tenha vivido e trabalhado fora há quase 20 anos, passando por Espanha, RU, EUA, Dinamarca, Brasil, Europa Central e, agora, México.
O facto de trabalhar em empresas globais, e nos últimos 10 anos na Roche, deu-me o privilégio de poder desenvolver uma carreira internacional.
Adoro o meu país e tento reforçar as raízes dos meus filhos, que nasceram fora, com a sua alma Lusa. A Portugalidade não se restringe ao território geográfico, mas sim a um conjunto de valores que partilhamos. Por isso, tenho vontade de poder contribuir, com a Diáspora, para reforçar essa Portugalidade que nos une.
2- Que vantagens ou desvantagens lhe trouxe o facto de ser português?
Provavelmente ambas. Gosto de pensar que nenhuma tenha sido determinante na minha carreira. Na maioria das vezes, somos nós próprios que nos colocamos rótulos.
O facto de ser português, pode ajudar na integração em países latinos pela maior proximidade linguística e cultural. Poder falar e entender um idioma, é importante para a integração profissional e pessoal em qualquer país e cultura.
No entanto, na minha experiência de trabalhar em países nórdicos, como Dinamarca, RU ou na Europa Central, senti que muito mais importante do que a nacionalidade, são a meritocracia e a disposição para entender e adaptar-se à cultura local que fazem a diferença. E em capacidade de adaptação e flexibilidade cultural, como Portugueses, temos boas referências.
3- Que obstáculos teve que superar e como o fez?
Não creio que tenha tido que superar obstáculos especiais por ser português. Dependendo do país de destino, a origem pode ter conotações diferentes, como ser português no Brasil ou no México, em que no primeiro caso pode estar associado a vagas de emigração históricas ou no segundo mais associado a ser ¨Europeu¨. As generalizações são sempre redutoras e tal aplica a todas as nacionalidades.
Tento não colocar rótulos a ninguém, nem a mim próprio, pela sua nacionalidade. Sempre tentei entender as culturas em que trabalhei e com quem trabalhei ou trabalho. Complexos de superioridade ou inferioridade pagam-se caros e a humildade é fundamental.
As empresas, cada vez mais globais, buscam diversidade nas equipas, pois tal melhora significativamente os resultados.
4- O que mais admira no país onde está?
Há muito por onde escolher, pois o México é um país admirável. Destacaria a cultura, as pessoas e a resiliência como povo.
A multiculturalidade do México e a sua riqueza histórica são impressionantes. A combinação pré-hispânica, colonial e contemporânea é única. Um país imperdível, na sua beleza natural, “pueblos mágicos”, comida e gente que recomendo a todos conhecer. O povo mexicano é extremamente acolhedor e carinhoso, e a sua capacidade de trabalho e resiliência é extraordinária.
Não posso deixar de destacar a importância de um país com 130 milhões de habitantes, 11° em população e 14° economia do mundo, em crescimento, com uma fronteira com os EUA que lhe traz desafios migratórios, mas muito mais oportunidades por nearshoring. A dimensão é impressionante e a escala é importante de um ponto de vista empresarial e geopolítico. Um país de desafios, mas de muito mais de oportunidades.
5- O que mais admira na empresa/organização em que está?
A cultura da Roche, de foco no paciente através da inovação, é extraordinária. Esta cultura vive-se a todos os níveis, desde o CEO aos colaboradores juniores, e nos vários países em que trabalhei. Tenho o privilégio de trabalhar na empresa de saúde que mais investe em Investigação (R&D) a nível mundial, e de poder contribuir diariamente para trazer essa inovação, qualidade e excelência para quem a necessita e assim ajudar a mudar vidas. No México, como em muitos países, existem enormes carências de acesso à saúde, e o facto de poder contribuir para diminuir essa brecha é realmente motivante. Outra dimensão que admiro profundamente é a prioridade que se dá ao desenvolvimento das pessoas; são elas que fazem a diferença nas organizações. Tenho o privilégio de trabalhar com colegas extraordinários.
6- Que recomendações daria a Portugal e aos seus empresários e gestores?
Pensar em grande e além-fronteiras. Executar com ambição e sustentabilidade. Escala e especialização são cada vez mais importantes e, salvo alguns poucos sectores de nicho, a internacionalização é fundamental.
Tenho um enorme respeito pelos empresários e gestores em Portugal. Embora à distância, tenho observado a evolução do tecido empresarial português, que me parece muito positiva, apostando mais na diferenciação pela qualidade, design, inovação e capital humano. O modelo dos salários baixos está, há muito, esgotado. Ecossistemas que fomentem o empreendedorismo, capital de risco, incubadoras de start-ups são fundamentais.
Existem áreas críticas para o desenvolvimento e investimento, onde se terá que avançar mais rápido: uma justiça eficaz e célere, menor carga fiscal e subsidiodependência e uma visão de longo prazo com previsibilidade regulatória. Sem criação de riqueza não há justiça social. Os empresários e gestores em Portugal são em muitos casos verdadeiros heróis. Não podemos esperar pelo Estado para resolver os nossos problemas estruturais; como gestores e empresários temos que liderar tal transformação.
7- Em que sectores do país onde vive poderão as empresas portuguesas encontrar clientes
O México é um país que, tendo os seus desafios, oferece enormes oportunidades. A sua economia é aproximadamente 6x o tamanho da portuguesa e cresce de forma sustentada, com estabilidade macroeconômica. Tem vento a favor, quer pelo seu bónus demográfico, contexto geopolítico mundial que favorece o nearshoring, fronteira com EUA e recursos naturais, quer pelo aumento de rendimento da população e sector empresarial pujante. A minha perceção é de que o México, com algumas honrosas exceções, é um mercado pouco conhecido para as empresas portuguesas. Considero que existem oportunidades transversais aos vários sectores de atividade, e convido os empresários portugueses a analisar as oportunidades e riscos neste mercado. O acordo de comércio entre México, EUA e Canadá é um fator adicional a considerar. Neste, como noutros mercados competitivos, a qualidade e inovação é fundamental.
8- Em que sectores de Portugal poderiam as empresas do país onde está querer investir?
Portugal pode ser interessante para as empresas mexicanas, não só como mercado doméstico cuja dimensão é limitada, mas como porta de entrada na UE e África. Por razões históricas, existe já uma forte relação empresarial entre México e Espanha e, nesse sentido, Portugal pode complementar uma presença já existente em Espanha e/ou jogar os seus trunfos próprios, nomeadamente a relação com PALOP, ou posicionando-se como um destino de relativo baixo risco, num contexto geopolítico mundial complexo, com capital humano qualificado, boa infraestrutura digital, em transição energética e que oferece acesso a mercados mais vastos na UE e África. Necessitamos, no entanto, de reduzir os nossos “̈custos” enquanto país – com uma carga fiscal elevada, justiça tardia, burocracia, imprevisibilidade regulatória e enorme peso do Estado na economia – para nos tornarmos mais atrativos. A receita é conhecida, mas precisamos de mais e melhor execução.
9- Qual a vantagem competitiva do país onde está que poderia ser aplicada em Portugal?
Várias das vantagens competitivas do México, como a dimensão, pirâmide demográfica ainda jovem, geolocalização, recursos naturais como o petróleo, são próprias e não diretamente extrapoláveis a Portugal. No entanto, existem lições que podemos apreender, como uma carga fiscal baixa que promove o investimento, a importância da natalidade e um forte espírito empreendedor. A cultura do esforço e valorização do trabalho é também notável.
Ambos países tiveram e têm uma forte emigração e, como tal, uma extensa diáspora recebendo importantes remessas de emigrantes. Mas a forma como vão aproveitar essa diáspora de um ponto de vista de conhecimento e rede político-económica e a capacidade de atrair o talento de regresso ao país, após experiência internacional, poderá fazer diferença.
10- Pensa voltar para Portugal? Porquê?
Sim. Adoro o meu país e visualizo regressar em determinado momento, provavelmente num contexto profissional diferente. Gosto de pensar que em determinado momento da minha vida poderei aplicar o que aprendi no meu país e contribuir para que os meus filhos reforcem a ligação às suas origens e família.