Este Conselho, estabelecido com o alto patrocínio do Senhor Presidente, procura mobilizar o talento nacional estabelecido além-fronteiras para os desígnios do país.
Foi-me dada a oportunidade de participar na reunião do Conselho da Diáspora, que se reuniu no passado dia 22 de Dezembro. Este Conselho, estabelecido com o alto patrocínio do Senhor Presidente, procura mobilizar o talento nacional estabelecido além-fronteiras para os desígnios do país. A atração de centros de serviços com elevado valor acrescentado e Portugal como destino de serviços de saúde foram os dois tópicos sobre os quais o Conselho refletiu.
Está bem estabelecido o valor que a diáspora tem para os países. Inúmeros estudos demonstram que as redes de identidade nacional ou étnica constituem um poderoso instrumento de desenvolvimento. Desempenham um papel nas relações comerciais, como instrumentos de ligação a parceiros e porta de acesso a mercados (chineses em África), no desenvolvimento de projetos empreendedores, nomeadamente através de apoios financeiros (judeus nos EUA), na cooperação científica, como colaboradores preferenciais (europeus nas universidades americanas), e em muitas outras dimensões.
Assim, é evidente o benefício de ligar o nosso país aos conterrâneos que se destacam além-fronteiras. A diáspora adquire particular relevância num país pequeno e desconhecido como Portugal. A relutância normal de um nacional de um país como os EUA ou a China relativamente a uma empresa portuguesa, por desconhecimento sobre o país de origem, pode rapidamente transformar-se em abertura ou apoio se o interlocutor no país for um português ou um luso-descendente.
A preocupação em fomentar a ligação da nossa diáspora ao país é recente. Mas isso é natural se refletirmos sobre a natureza histórica da nossa emigração. É conhecido o nosso baixo nível educacional, em que apenas 17% da população entre os 25-64 tem atualmente uma qualificação superior, contra 32% nos seus congéneres da OCDE. Esta percentagem era ainda mais baixa entre os nossos emigrantes. Apenas a partir de 2011 a qualificação média dos emigrantes passou a ser superior à da população portuguesa. E são estes imigrantes mais qualificados que constituem a diáspora que pode ajudar a desbravar caminhos em larga escala para as empresas e empreendedores nacionais. Com um número cada vez maior de emigrantes qualificados, ganha relevância o grupo e o seu papel no país.
Mas aqui surge o paradoxo. A diáspora não se estabelece sem saídas de pessoas, em particular os mais qualificados, o que é naturalmente visto com preocupação no país. Assim sendo, a recente vaga de emigração qualificada, a chamada fuga de cérebros, que acontece desde o início da crise, é condição necessária para o estabelecimento de uma diáspora com dimensão e valor económico. Estes cérebros saem porque é importante para eles próprios, criando oportunidades para desenvolver e valorizar o seu potencial intelectual, como não seria possível em Portugal. Mas, no seu conjunto, vão estabelecendo uma diáspora forte e reconhecida, que muito valor pode trazer ao país.
Fica a questão se não seria melhor que estes cérebros nunca tivessem saído. Porventura assim será. Mas é uma questão hipotética, já que o contexto do país não muda de um dia para o outro. E, tendo saído, não é necessário que se percam para o país. Sendo móveis, os emigrantes estão abertos a novas oportunidades e desafios, inclusivamente no seu país de origem. Esta última dimensão é reconhecida em vários estudos recentes. O desenvolvimento da Coreia do Sul e da Irlanda a partir dos anos 90 atraiu de volta muitos nacionais baseados por todo o mundo, especialmente nos EUA. De igual modo, muitos indianos, emigrantes para os EUA e Reino Unido, têm voltado para protagonizar iniciativas empreendedoras nas áreas de software e serviços partilhados. Algo semelhante está agora a ocorrer na China.
A nossa crescente diáspora pode desempenhar um importante papel económico. Se não voltar, podemos aprender a usar a diáspora como guarda avançada da nossa economia. E se conseguirmos arrumar a casa, a possibilidade de que voltem mais experientes e capazes não é remota. Eu próprio já fiz parte da diáspora durante 15 anos, e aqui estou de volta a Portugal a protagonizar um projeto com ambição e relevo internacional.
Por Jornal de Negocios, Francisco Veloso, 28 Dezembro 2014